Conectados demais: como o uso excessivo de celulares pode afetar a saúde das crianças

O uso excessivo de celulares por crianças é uma prática que tem gerado preocupações e debates entre especialistas e pais (ou responsáveis). Embora o celular possa ser uma ferramenta valiosa para o desenvolvimento infantil quando usado adequadamente, o seu uso exagerado pode acarretar problemas como a dependência tecnológica, isolamento social, sedentarismo e impactos negativos na saúde mental. Por isso, é importante que os pais estejam atentos ao tempo de uso e orientem seus filhos sobre a utilização consciente e responsável da tecnologia móvel.

Sabemos que sim, existem vantagens importantes no uso do celular pelas crianças, uma vez que ele pode ser um recurso valioso para a educação. Contamos com inúmeros aplicativos educativos que oferecem jogos e atividades que podem auxiliar no aprendizado de diversas disciplinas, como matemática, ciências e línguas estrangeiras. Outrossim, muitas escolas já utilizam a tecnologia móvel como uma forma de complementar o ensino presencial, permitindo que as crianças estudem em qualquer lugar e a qualquer momento.

Para mais, o celular também pode ser usado como uma forma de manter contato com familiares e amigos, as crianças podem fazer chamadas de vídeo para seus avós, tios ou primos, permitindo que mantenham vínculos importantes mesmo quando não é possível se encontrar pessoalmente. De certo modo, isso contribui para a saúde mental e emocional das crianças, reduzindo a sensação de isolamento e solidão.

No entanto, o excesso de celulares por crianças pode ter impactos negativos na saúde e bem-estar dos pequenos. Em primeiro lugar, o uso prolongado de celulares pode prejudicar a saúde ocular, causando fadiga, ressecamento e irritação nos olhos, além de problemas de visão a longo prazo. Utilizar os dispositivos móveis imoderadamente pode levar a uma postura inadequada e problemas musculoesqueléticos, como dores no pescoço, costas e ombros.

Outro problema associado ao excesso de tela é a dependência tecnológica (nomofobia), que pode afetar negativamente a saúde mental das crianças. A constância no uso de dispositivos móveis tende a levar a comportamentos compulsivos, ansiedade, depressão e isolamento social. Além disso, o uso descomedido de redes sociais pode, ainda, levar as crianças a desenvolverem uma imagem distorcida de si mesmas e uma pressão constante por aceitação e aprovação social.

De acordo com Elizabeth Kilbey (2018), psicóloga infantil britânica, autora do livro “Como criar filhos na era digital”, a tecnologia, como o uso excessivo de celulares, pode ser prejudicial ao desenvolvimento das crianças, especialmente quando usada como uma distração constante ou uma forma de evitar emoções desconfortáveis. Para a autora, é preciso desmitificar o mito do ‘uso consciente’ de celulares pelas crianças, uma vez que criança em idade latente, não tem habilidade cognitiva para gerir seu tempo de tela.

De maneira similar, o neurocientista francês Michel Desmurge, autor do livro “A fábrica de cretinos digitais”, destaca que o uso copioso de telas, especialmente o uso de celulares, pode prejudicar o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças, além de aumentar os riscos de problemas de saúde, como obesidade, miopia e problemas de sono.

O celular também pode ser uma fonte de conteúdo inapropriado para crianças, especialmente quando utilizam a internet sem supervisão. As crianças podem ter acesso a conteúdos violentos, sexualmente explícitos ou inapropriados para a idade, o que pode afetar negativamente o seu desenvolvimento e bem-estar emocional. Para mais, o acesso a informações falsas ou inadequadas pode prejudicar a formação de opinião e valores das crianças.

Conforme expressa o neurocientista Sidarta Ribeiro (2018), o uso descomedido de celulares pode prejudicar, em demasia, o sono das crianças e adolescentes, afetando seu desenvolvimento cognitivo e emocional, uma vez que a luz emitida pelos celulares pode inibir a produção de melatonina, hormônio responsável pela indução do sono, o que pode prejudicar o sono reparador e levar a problemas de saúde a longo prazo.

Segundo o relatório “Global Kids Online Brasil”, publicado em 2019, cerca de 80% das crianças brasileiras entre 9 e 17 anos possuem celular. A pesquisa também revelou que a maioria das crianças utilizava os dispositivos móveis para acessar as redes sociais (74%), jogar (64%) e assistir a vídeos (62%). A pesquisa apontou que 1 em cada 5 crianças já recebeu mensagens ofensivas ou ameaças online e que cerca de 1 em cada 3 crianças já teve contato com algum tipo de conteúdo inadequado na internet.

Outra pesquisa, realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), revelou que o acesso à internet por crianças no Brasil tem aumentado nos últimos anos. Em 2019, cerca de 85% das crianças entre 9 e 17 anos acessaram a internet pelo menos uma vez por semana, sendo que a maioria (78%) utilizava o celular como principal dispositivo de acesso. A pesquisa também apontou que as redes sociais eram as principais atividades realizadas pelas crianças na internet, seguidas por jogos e vídeos online.

Assim sendo, os pais (ou responsáveis) podem adotar algumas ações para acompanhar seus filhos no uso do celular e minimizar o tempo de telas pelas crianças. Algumas sugestões são:

  • Estabelecer limites de tempo: Os pais podem definir horários específicos para o uso do celular, como, por exemplo, após as tarefas escolares e por um tempo limitado, respeitando o tempo máximo recomendado para cada faixa etária.
  • Supervisionar o conteúdo acessado: Os pais devem acompanhar as atividades realizadas pelos filhos no celular e orientá-los sobre o conteúdo adequado para a sua idade, evitando que tenham contato com conteúdos inapropriados.
  • Conversar sobre os perigos da internet: Os pais devem conversar com os filhos sobre os riscos associados ao uso da internet, como o cyberbullying, o contato com desconhecidos e o acesso a conteúdos inapropriados.
  • Estimular atividades fora das telas: Os pais podem estimular atividades lúdicas e criativas fora das telas, como jogos de tabuleiro, leitura, atividades ao ar livre, entre outras.
  • Usar aplicativos de controle parental: Existem aplicativos de controle parental que permitem que os pais monitorem o uso do celular pelos filhos, definindo horários de uso, bloqueando conteúdos inadequados e acompanhando a localização das crianças.
  • Dar exemplo: Os pais devem dar exemplo e reduzir o seu próprio tempo de uso de dispositivos móveis, demonstrando a importância de um uso consciente e equilibrado da tecnologia.

Existem diversos aplicativos de controle parental disponíveis no mercado. Alguns exemplos são:

  • Qustodio: Permite monitorar o uso de dispositivos móveis, definir limites de tempo e bloquear conteúdos inapropriados.
  • Norton Family: Permite monitorar as atividades online das crianças, definir limites de tempo e bloquear sites e aplicativos inapropriados.
  • Kaspersky Safe Kids: Permite monitorar o uso de dispositivos móveis, controlar o acesso à internet e definir limites de tempo para uso de aplicativos e jogos.
  • Google Family Link: Permite definir limites de tempo, bloquear aplicativos e controlar o acesso à internet em dispositivos móveis.

Portanto, quando usado adequadamente, o celular pode ser uma ferramenta valiosa para o desenvolvimento infantil, permitindo o acesso a informações, estímulos cognitivos e interações sociais positivas. Porém, quando utilizado excessivamente e sem supervisão, o celular pode trazer riscos para a saúde e bem-estar das crianças, tais como dependência tecnológica, sedentarismo, isolamento social, exposição a conteúdos inadequados e impactos negativos na saúde mental.

Em resumo, é importante que os pais estejam atentos e acompanhem o uso do celular pelas crianças, orientando-as sobre o uso consciente e responsável da tecnologia, estabelecendo limites de tempo e supervisionando as atividades realizadas no dispositivo.

Saiba mais: SBP atualiza recomendações sobre saúde de crianças e adolescentes na era digital

Rosana Abutakka é Doutora e Mestra em Educação. Pedagoga e Psicopedagoga.

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